O luto é uma reação natural a perda de algo ou alguém significativo, gera sentimento de angústia e muita tristeza. O luto não está ligado apenas à perda por morte, mas também a situações e vivências que podem levar ao luto, por exemplo: aposentadoria, envelhecer, mudar de cidade, perder um amigo, um animal de estimação, às vezes terminar a faculdade, fechar um ciclo. Escolhas de vida que trazem mudanças também inclui em perda e por isso está ligada a um processo de luto.
É um processo lento e doloroso, tem como característica o afastamento de atividade que não esteja ligada a pensamentos sobre o objeto perdido, a perda de interesse no mundo externo e a incapacidade de substituição com a adoção de um novo objeto de amor (FREUD, 1915).
O tempo do luto é variável e em alguns casos pode durar anos, em outros nunca termina. De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID 11), e o Manual Estatístico de Transtornos Mentais DSM 5-TR, o luto prolongado é uma reação mal adaptativa que só pode ser diagnosticada depois que tiverem se passado pelo menos 12 meses (seis meses em crianças e adolescentes) .
O luto se torna patológico quando a pessoa apresenta dificuldade em expressar abertamente todos os sentimentos envolvidos na situação de perda e quando a pessoa manifesta as características de forma prolongada e severa. Segundo Bowlby (1990), o tempo de duração e vivência dependerá do grau de intensidade da relação com o objeto perdido. Fatores internos, estrutura psíquica do enlutado, histórico de perdas anteriores, circunstâncias da perda, crenças culturais e religiosas e apoio recebido são fatores que determinam seu processo.
Em Luto e melancolia Freud (1917 [1915]) [1996]), descreveu o luto como "um trabalho que o ego tem que realizar para adaptar-se a perda do objeto amado, frente a percepção da realidade de que este foi perdido".
Já Klein (1940), considera o luto como um dos fenômenos da posição depressiva arcaica. A dor desencadeada pela perda da pessoa amada é ampliada pelas fantasias inconscientes do sujeito que acredita ter perdido também seus objetos internos bons.
De acordo com Bowlby (1984), o processo de luto acontece em quatro fases:
a) A fase do torpor, aturdimento (choque): essa fase pode ser acompanhada por tensão, raiva ou pânico. b) A fase da saudade e a busca da figura perdida: características dessa fase são alarme, tensão, estado de vigília, preocupação com os pensamentos sobre a pessoa perdida, perda da aparência pessoal. c) Desorganização e desespero. d) Fase de alguma organização: aceita e se conscientiza da perda e da necessidade de reconstrução e continuidade da sua vida. Há uma diminuição da depressão e da desesperança, começa um investimento afetivo na vida e às vezes chega a fazer algumas mudanças.
A formas de enfrentamento da perda depende de cada pessoa, mas elas possuem algumas variações:
Negação
Raiva
Barganhar por mais tempo
Depressão
Aceitação
Na negação existe muita dificuldade em entender e aceitar o que aconteceu. A dor é sentida tão intensa, que imagina-se que não poderia ser real, a perda parece impossível nesse momento, a ponto do sujeito não conseguir acreditar. Percebem-se reações adversas como risos, choros, falas incessantes, catatonia e recolhimento.
Apesar da perda real, existe um sentimento de raiva racionalmente que não faz sentido. É comum o pensamento “porque comigo?”. Surgem nesta fase sentimentos de inveja e revolta.
A negociação ou barganha começa quando o sujeito percebe a hipótese da perda e devido a isso tenta barganhar a maioria das vezes com forças superiores, com a finalidade de tentar mudar a situação. É basicamente uma troca que o sujeito procura fazer para minimizar a dor, sob a forma de promessas como recomeçar, mudar um hábito, reformular os valores e conceitos (KUBLER- ROSS, 1996).
A depressão se instala quando o sujeito toma consciência da perda e que não há como contorná-la. Dá lugar ao sentimento de um “espaço” vazio da pessoa (ou coisa) que perdeu. Seguido por profunda angústia e solidão, e com ela vão-se os sonhos e projetos idealizados. A aceitação é o momento em que o sujeito ainda sente tristeza, mas com certa tranquilidade, sem desespero. Ele é capaz de voltar às atividades normais, aos poucos, dando um lugar para o sentimento da perda e muitas vezes com a capacidade de preencher o vazio provocado. Nessa fase o espaço vazio deixado pela perda é preenchido.
O luto infantil
A morte para criança é algo mais complexo, até os 7 anos (estágio pré-operatório) a criança não possui recursos internos para compreender a perda (morte). A morte é subjetiva e para a criança a pessoa amada que partiu ainda vive em sua fantasia, podendo ressurgir a qualquer momento. Embora no plano emocional racional sente-se forte e distante da morte, o adolescente também pode ter essa ideia fantasiosa sobre a morte: acaba tentando o suicídio pensando morrer só um pouco. E já que nessa fase a morte parece estar tão distante, ele a desafia continuamente. Ainda em relação a criança, a partir dos 7 anos ela compreende a morte como irreversível, ou seja, que uma pessoa, um animal ou uma flor não voltarão a viver; consegue entender que a morte é universal e acontece com tudo que tem vida. Outro fator presente na infância é o sentimento de culpa, ao associar seus desejos à morte do outro.
Como posso ajudar uma criança em processo de luto?
- Conversando e explicando que a morte é definitiva e a criança não causou a morte por maus pensamentos. - Fazendo com que ela se sinta segura e acolhida tendo a certeza que vai continuar recebendo cuidados/amparo de adultos e carinho. - Evitando fazer mudanças no ambiente e na rotina da criança. - Responder suas perguntas de maneira simples e honesta, encorajando-a a falar da pessoa que perdeu. - Usar livros de histórias ou filmes infantis que abordem o tema.
A criança acaba sofrendo as influências do processo de luto dos adultos e do nível de informação que recebe. Informações sonegadas, confusas como: morar no céu ou que o anjo ou fada veio buscar, atrapalham o processo de luto. Informações como dizer que a pessoa foi viajar, acabam não permitindo que a elaboração da perda aconteça, porque a criança ficará a espera do retorno da pessoa que morreu. Os pais escondem seus sentimentos para não entristecer os filhos.
Vale ressaltar novamente que a maneira de lidar com o luto é individual e varia de acordo com cada indivíduo, o apoio social é essencial pra superar esse momento. A ajuda profissional em caso do luto patológico também pode auxiliar no processo de elaboração desse momento difícil da vida.
Ajuda
Caso o psicóloga encontre indícios de luto persistente, é necessária a introdução de psicoterapia, aliada à avaliação de outros profissionais para indicação ou não de terapia medicamentosa. O profissional deve identificar quais as características principais apresentadas pelo enlutado e trabalhar no sentido de ajudá-lo a lidar com este momento da vida.
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𝐿𝐼 Lana Ito Psicóloga CRP 06/184345 | Psicopedagoga E-mail: lanaitopsi@gmail.com
Insta: @lanaito
REFERÊNCIAS
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5-TR. 5.ed. rev. Porto Alegre: Artmed, 2023.BEE, H. A criança em desenvolvimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
_____. O ciclo vital. Porto Alegre: Artes MÉDICAS, 1998.
BOWLBY, J. Apego e Perda. Apego. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1990.
CAVALCANTI*, Andressa Katherine Santos; SAMCZUK*, Milena Lieto e BONFIM**, Tânia Elena. O conceito psicanalítico do luto: uma perspectiva a partir de Freud e Klein. Psicol inf. [online]. 2013, vol.17, n.17, pp. 87-105. ISSN 1415-8809.
FREUD, S. (1917 [1915]) [1996]). Luto e melancolia. In: Obras completas. Rio de Janeiro: Imago.
KLEIN, Melanie. O luto e suas relações com os estados maníaco-depressivos (1940). In:______. Amor, culpa e reparação e outros trabalhos (1921-1945). Obras Completas de Melanie Klein. Vol. I, Rio de Janeiro: Imago, 1996.
MIYAZAKI, Maria Cristina de Oliveira Santos. MAYCOLN, Teodoro. Tópico 6 luto. Sociedade Brasileira de Psicologia, 2020.
PIERASSOL, Alessandro Ferreira et al. As fases do luto frente à castração. Revista Científica Fagoc Multidisciplinar - Volume II - 2017.
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